Tuesday, September 15, 2009

Quando nem tudo cabe no tempo

"I am only resolved to act in that manner, which will,
in my opinion, constitute my happiness"
(Jane Austen)


Não tenho usado muito este espaço para desabafos (pelo menos não de forma direta), mas vou usá-lo hoje. Por muitas razões que nem vêm ao caso. E vou dedicar o post a minha amiga Andressa, mais uma vez pela cumplicidade e por saber que ela compartilha de alguns dos meus sentimentos (e ocupações).


"Você tem até o dia 18 para enviar o artigo!", "Não esqueça o prazo das inscrições!", "Prepare o projeto!", "Faça!"... Frases como essas têm posto em desespero os meus dias meio angustiantes. Há muito desejo de fazer tudo isso e produzir. Produzir materiais relevantes para a minha carreira. Investir no que não vai embora.
Mas o acúmulo das atividades, dos compromissos e os miseráveis imprevistos parecem tomar uma proporção incapaz de caber em meus minutos. Sinto o cruel desespero e a dúvida de estar ou não seguindo os caminhos certos. Estar ou não agindo da maneira que, em minha opinião, constituirá minha felicidade. Minha mente e meu corpo sentem o peso do amontoado de coisas... E ainda aqueles alunos problemáticos! Talvez eu devesse me dedicar mais à pesquisa...
O corpo é o que mais sente, pois já em desespero, ele pede e pede muito. Clama até! Mais que nunca tenho dúvidas. Dúvidas das quais nada em mim é capaz de fugir. Tenho dúvidas e afirmo isso no melhor estilo Meryl Streep no filme Dúvida (Doubt, 2008).
Queria tomar um sorvete na praia e observar, pelo menos por alguns instantes os dias passarem, os carros passarem, as ondas fazerem seu balé... Queria sentir o vento do fim da tarde batendo no meu rosto como quando, há anos, eu pegava o ônibus de número 510 e ia tomar sorvete na Friberg. Meu sorvete de menta com chocolate favorito e que era sempre seguido por uma longa e agradável caminhada. Sim! Nunca pensei que pudesse dizer isso um dia, mas eu, às vezes, sinto falta de pegar um ônibus e sentir o vento no rosto sem me preocupar com o trânsito.
E como se não bastasse o tempo que insiste em não abrigar tudo o que eu tenho para fazer, ainda me aparece aquela fase da insegurança e das dúvidas. A fase mais cruel do tempo da saudosa espera.
Saudosa espera... Isso me faz pensar em uma coisa que talvez até der certo: esperar! É só o que homens como eu podem fazer. No meu caso, porém, esperar com os braços bem descruzados e com uma montanha de livros como companhia.

Friday, September 04, 2009

Biblioteca Itinerante


Quando era bem pequeno, eu tinha mania de pegar livros emprestados na pequena biblioteca itinerante que parava vez por outra na minha cidade. Para mim, toda vez que a biblioteca chegava era como se toda a felicidade do mundo fosse se realizar naquela estrutura móvel instalada na pracinha da cidade.
Minha cidade era uma cidade calma e pequena. Tão pequena que a pracinha principal ficava quase de frente para o mar. E era lá, quase de frente para o mar, que a biblioteca, como uma esperança para os meus pacatos dias, se instalava. Que festa! Acordava cheio de esperança depois de uma noite de ansiedade. Quais livros encontraria? Será que os últimos lançamentos das minhas coleções favoritas estariam disponíveis?
Eu corria para aquele pequeno espaço montado no meio da praça e lá passava o dia inteiro. Não lia, devorava com meu olhar faminto todas aquelas palavrinhas deitadas nas mais perfeitas páginas. Transitava entre os livros na esperança de que a companhia deles preenchesse meus dias vazios e pouco coloridos. Talvez por isso, eu buscasse sempre os livros mais coloridos. Ora livros amarelos feito o sol; ora, livros azuis como o infinito.
Lembro de uma vez em que encontrei um livro especial. Que obra! Quantas palavras perfeitas! Levei o livro comigo apertando-o contra o peito, como se quisesse colocá-lo dentro do meu coração. Cada linha lida me proporcionava mais felicidade. Cada minuto de leitura me fazia sentir o prazer jamais sentido. Eu estava fascinado!
Mas o livro era muito grande. Tinha muitas páginas e eu, leitor imaturo, era lento e acabei não conseguindo lê-lo de uma vez só. Tive que devolver o livro, pois a biblioteca viajaria para outra cidade. Chorei quase todas as minhas lágrimas de criança quando entreguei o livro nas mãos da senhora que tomava conta da biblioteca. A partida daquele livro causava um imenso vazio.
Meses depois, a biblioteca voltou. Corri para a pracinha, quase de frente para o mar, e encontrei aquele livro responsável por alguns dos meus melhores dias. Peguei-o novamente. Consegui avançar na leitura, li por vários dias sem parar. Estava mais uma vez preenchido de esperança e daquele prazer que até hoje não consigo definir.
Avancei na leitura, mas não consegui acabar de ler o livro. Era de fato muito grande. A biblioteca itinerante mais uma vez precisou partir. Foi para outra cidade. Longe... Para bem longe foi o meu livro querido. Outras tantas lágrimas de criança sozinha jorraram dos meus olhos. Um vazio tomava conta do espaço que só aquele livro conseguia ocupar. Um vazio no coração. Já eu, era de novo a criança carente à espera incerta de quando o livro de páginas coloridas voltaria aos meus braços.

Wednesday, September 02, 2009

Sobre o que interessa

Acredito que todos nós, pelo menos uma vez, já ouvimos a famosa frase: "Nós não fazemos só aquilo de que gostamos". Não dá para discutir a verdade dessa antiga sentença que nossos pais geralmente nos ensinam e exigem que coloquemos em prática na nossa vida. Mas, por outro lado, é muito verdadeiro, diria que sumarento até, o desejo de filtrar as coisas para vivermos e sentirmos só aquilo que nos interessa.
O cantor Lenine tem uma música chamada É o que me interessa. Na letra, o músico fala sobre utilizar esse filtro e ficar com o que realmente interessa. Ver as pessoas que nos interessam. Bloquear o resto e transformar o mundo exterior em miragem, como a própria música diz. Quem de nós não desejaria possuir um filtro como esse? Quem de nós não desejaria dizer não a um monte de coisas e viver só o que é bom e agradável? Eu desejaria.
Há vezes em que, assim como na música, é preciso que uma tarde faça silêncio e que nós possamos repousar tranquilos em uma rede como se no mundo nada estivesse acontecendo. Há vezes em que é preciso dizer não e sentir que é nosso, de verdade, o poder de dizer não. E enxergar do conforto da rede, ou do sofá da sala, ou da cama "o vento soprar a nosso favor", nos guiando por uma viagem íntima, na qual pressentimentos serão o prenúncio da saudade de algo que ainda está por vir. Nessa viagem, além dos pressentimentos, também deve haver espaço para pensar naquela pessoa especial. Pensar naquela pessoa que tem o poder de te fazer sossegar. Naquela pessoa que faz teu relógio íntimo atrasar. E como é bom perceber que você, aquela pessoa que acorda cedo pensando nas muitas obrigações, é capaz de se entregar a alguém tão intensamente ao ponto de acordar às duas da tarde em plena terça-feira.
Parar! Às vezes, é preciso parar e pensar no que realmente interessa, mesmo que para isso, antes precisemos fazer uma dezena de coisas que não suportamos.